O grande voo do pardal
Esta narrativa
desenvolve-se essencialmente em torno do valor da amizade, dando a
ver a sua capacidade transformadora (e regeneradora) na vida humana.
Trata-se de uma amizade singular, pois liga homem e um pequeno
pardal. Este parece conseguir acordar sentimentos protetores e muda
por completo a vida (mas também os comportamentos e os valores) do
homem, fazendo-o descobrir alegrias desconhecidas e o valor da
partilha e dos afetos, sobretudo quando vividos em liberdade.
Para além desta dimensão, o que mais individualiza esta narrativa é o facto de retratar uma ligação entre dois seres igualmente livres e onde o sentimento de posse não existe, ao contrário do que é habitual nas relações entre homens e animais, quando estes são pertença dos primeiros como animais de estimação. De facto, o homem trata do pardal quando este precisa de cuidados e depois deixa-o livre para seguir a sua natureza, entre os seus iguais pardais. Aliás, até incentiva a partida, mas o pardal parece ter-se afeiçoado ao seu par humano e resiste; acabará por partir, mas regressa para ficar.
Ainda que ficcional, a narrativa não humaniza o pardal, não lhe atribui sentimentos de forma expressa e perspetivada do ponto de vista humano, e dá até a conhecer alguns traços do que é a vida dos pardais, como animais livres seguindo a sua natureza.
Assim, sem adotar de forma visível um cariz didático ou moralista, esta obra pode ser entendida como narrativa exemplar das relações entre homens e animais num cenário de livre igualdade.
As ilustrações de Inês de Oliveira sublinham, com subtileza e expressividade, a tonalidade dominante na narrativa, cristalizando a união entre o homem e o pássaro e proporcionando ao leitor diferentes perspetivas dessa original ligação. Para além dos afetos, a representação do voo simboliza a liberdade, que também é mote central.
Ramos, A. M. & Ramos, R., 2010